Saí do curso ao meio-dia e meia. Entrei no ônibus 24, como de costume, mas não sei porque a última parada dele foi em Trafalgar Square e não na New Scotland Yard, ao lado da minha casa. Decidi ir andando, cerca de 20 minutos.
Passei pelo Thames. Vi a London Eye do outro lado. Entrei por Westminster. Dei de cara com um monte de turistas tentando a melhor foto do Big Ben, normal. Segui pelo Parlamento até a Abadia de Westminster. O movimento ainda maior que o usual chamou minha atenção.
No jardim da Abadia, dezenas de idosos passavam lentamente de um lado para o outro, alguns com uma cruz na mão, todos com uma flor vermelha na lapela. A flor é a poppie, usada por muitos ingleses em novembro. Uma homenagem aos combatentes que morreram nos campos de batalha.
Amanhã é comemorado o Remembrance Day. Uma celebração com a participação da Rainha que acontece todo ano na décima primeira hora do décimo primeiro dia do décimo primeiro mês, que foi quando foi assinado o Armistício que pôs fim à Primeira Guerra Mundial, em 11 de novembro de 1918.
Amanhã é o dia da celebração mas as homenagens aos que morreram nas guerras começam no início de novembro. Durante todo o mês, os ingleses usam uma flor, a poppy, presa geralmente do lado esquerdo do casaco. A escolha pelo lado esquerdo tem explicação, segundo eles: para os homens porque é o lado em que eles recebem as medalhas e para as mulheres pois é o lado em que a viúva deve honrar a medalha do marido. As flores, em geral de plástico, são vendidas em vários pontos de Londres, principalmente nas estações de metrô, e o dinheiro arrecadado vai para a Royal British Legion Poppy Appeal Benevolent Fund, instituição dedicada aos veteranos e seus dependentes.
Para nós, brasileiros, que não sofremos as consequências de uma guerra como os europeus, é difícil entender a importância que eles dão a essa data. Tenho viva em minha memória uma história que meu pai me contou. A família russa teve de deixar o país por causa do comunismo. Por conta disso, meu pai nasceu na antiga Iugoslávia. Nas andanças pelo mundo, foram parar num campo de refugiados na Áustria. De lá, fugiram numa carroça durante uma noite. Tiveram que deixar pra trás meu bisavô. Ele próprio renunciou a fuga e de certa forma a vida por se sentir velho e doente. - "Eu só vou dar trabalho para vocês, me deixem ficar", teria dito. Meu pai conta que depois meu avô ainda tentou localizar o pai, em vão. Nunca mais tiveram notícias.
Isso foi o mais perto que eu estive da guerra. Uma história que ouvi na infância e me emociona ainda hoje. Por isso, respeito a dor da guerra. Daí eu ter parado para contemplar os velhinhos ingleses a procura de um nome entre tantas cruzes. São milhares.
O meu lado jornalista pulsou forte e tive vontade de entrevistar aquelas pessoas, conhecer aquelas histórias. Senti o peso de uma realidade que não é minha, não é do meu povo nem do meu país, mas que me pertence porque diz respeito ao homem, ao ser humano, num dos seus momentos mais dramáticos.
O meu lado jornalista pulsou forte e tive vontade de entrevistar aquelas pessoas, conhecer aquelas histórias. Senti o peso de uma realidade que não é minha, não é do meu povo nem do meu país, mas que me pertence porque diz respeito ao homem, ao ser humano, num dos seus momentos mais dramáticos.
No ano passado, escrevi um post sobre este assunto onde conto o que é a poppie e o porquê ela simboliza os combatentes ingleses que morreram nos campos de batalha. Você pode conferir em:
- Poppies, Remembrance Day e Eu com isso?